terça-feira, 4 de dezembro de 2018

O VELHO FILATELISTA (CONTO

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O VELHO FILATELISTA (conto)
Sendo ainda adolescente o destino permitiu que fosse trabalhar para uma freguesia mais a sul do distrito de Lisboa, onde o vinho era uma das riquezas do sítio.
O trabalho era variado, relacionado com a produção vinícola, apesar da juventude, já me considerava um mestre nessas tarefas, no entanto mais um ajudante dos trabalhos do campo, como muitos outros, que havia na zona.
A localidade, que se chama Miragaia, abundava a uva, da qual se produzia muito vinho tinto carrascão e em época de recessão económica, o lugar acolhia toda a classe de trabalhadores.
Então dizia-se, que ali se secava muito bagaço (casca da uva depois de espremida) e era por isso que se vivia bem.
Portanto Miragaia, no sul do Distrito de Lisboa, era uma localidade onde mesmo os pequenos proprietários, tinham o seu moço. De modo que ter o seu criado – normalmente procedente de fora – significava pertencer a outra classe de poder económico.
Havia criados de servir de distintas categorias, dependendo do nível moral ou riqueza dos amos.
Este criado que vos fala, ao ter como patrão um dos mais recomendáveis era considerado um servente de luxo, era assim que o tratava a patroa, Dona Eduarda. Notava-se em ocasiões que o mandava fazer certas tarefas, recomendando: “A pessoa com que tens de falar é muito esclarecida”.
Afinal, o cargo pressupunha algum prestígio a quem o exercia e consequentemente, a quem executava os serviços inerentes.
Ao cair da noite, diariamente, quando haviam acabado os afazeres, ia a uma espécie de café, um local que vendia tudo e durante o serão era ponto de encontro aberto a todos. Ali comprovava-se que democracia, não era apenas mais uma palavra, era a realidade dessa casa.
Convém assinalar que estávamos nos anos cinquenta do século XX.
Aquele local não era, pois, uma taberna qualquer, porque se podiam encontrar, à disposição a maioria dos periódicos, que se publicavam. Eram eles que me levavam para ler e andar informado, já faziam parte dos tempos livres.
Naquela época, parecia um trabalhador do campo dotado de grande sensibilidade e talvez devido à singular postura que sempre adoptava, durante essas leituras, numa dessas noites fui abordado pelo senhor Onofre.
Este, desde então, passou a ser grande amigo.
Vendo que me interessava um pouco por selos usados, o que lhe mereceu atenção especial, visto dispor de uma boa colecção de Portugal.
As estampilhas postais fascinavam-me e pensava que, com elas podia organizar uma colecção de muito interesse, mas tenho de reconhecer, nem sequer conhecer bem o termo filatelia e desconhecia existirem associações próprias de amigos dos selos.
A partir dessa nova amizade e a gente que conheci, graças a esse factor, converti-me em filatelista de que o velho Onofre é responsável, de que me dedicasse mais a esse maravilhoso mundo.
Onofre veio a perder a sua esposa, devido a enfermidade, mas tinha uma filha chamada Ercília, mais velha que eu, mas por quem tinha já uma grande estima, talvez mais uma espécie de amor. Seu pai não me desalentava, pelo contrário.
Daí passei a visitá-los amiúde e era sempre bem recebido. Cresceu a amizade, com a miúda, mas jamais passaria disso.
Depois de ter trabalhado em Miragaia, os regulares encontros passaram a pertencer ao passado, ficou a amizade e a recordação do velho Onofre e essas terras que o tempo acabou imortalizando, pois ali estava o berço dos dinoussários Lourinhasaurus, que pisaram muito essas terras, há milhões de anos atrás.
E o próprio Lourinhausarus está imortalizado pela filatelia, em etiquetas AMIEL.
De tempos a tempos fui visitando aquela família, e quando fui mobilizado para o Ultramar, fui despedir-me. Sempre revia a colecção, o orgulho desse coleccionador. Diria que considerava os álbuns como um símbolo de distinção, dado que era homem do campo.
Herdou muito desse património de um tio, que pertenceu ao exército e desenvolveu a colecção, tornando-a mais atractiva.
De facto, seria a única pessoa a quem a mostrava orgulhosamente, comentando o seu tesouro, formado por toda a série da rainha D. Maria II, os selos do Rei D. Pedro da primeira série de Santo António de Lisboa e muitos outros, tudo novo e impecável.
Passaram uns anos e um dia visitei o velho Onofre, com grande prazer, esperava o ritual de voltar a contemplar os álbuns. Então pude ver umas fotocópias, haviam substituído os selos, bem colocados como foram os originais.
Ercília olhou-me, com olhos que não sorriam como de costume, mostravam-se inertes e tristes. O meu estado de ânimo também estava em baixo, pois suspeitara de algo, mais tarde compreendi melhor o que ocorrera.
A proverbial placidez manteve-se, habitual nessas situações. Vi então que o velho Onofre havia perdido o sentido da vista, quase por completo e compreendi a via das fotocópias, para representarem os selos, como das peças originais se tratasse.
No final, sendo boa anfitriã, Ercília acompanhou-me à saída e foi quando pude saber o que havia ocorrido.
Devido a doença prolongada, o meu amigo Onofre a perder a vista e ao tratá-la iam-se esvaindo os recursos financeiros, mesmo bem administrados pela filha escasseavam, pelo que foi preciso recorrer a experts em filatelia, para equilibrar a economia e permitir que o velho pai, vivesse ao últimos anos da vida de forma digna.

Daniel Costa

segunda-feira, 3 de dezembro de 2018

FORAM FAVAS


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FORAM FAVAS

Camilo Castelo Branco titulou um dos seus livros, por RIQUEZA DO POBRE E POBREZA DO RICO.
A leitura do livro nos dá a explicação do porquê do título; é que os rico ao degustarem, por exemplo, uma refeição simples chama-lhe um manjar, tal como um pobre diz manjar, de uma lauta refeição de rico. A mesma que ele, rico, come diariamente.
Ora este paralelo, vem a propósito de um facto que eu protagonizei, no campo, na Bufarda, no sítio do Fanfarrão;
- Tinha 9 anos, estava já de férias escolares, ainda havia costaneiras (palha) de favas por apanhar, que faziam falta para aquecer o forno, a fim de cozer a fornada de pão de milho.
Pois bem, acompanhei a mãe para ajudar esta na sega das mesmas. As costaneiras das favas eram rijas até que, a determinada altura, na trajectória, deixei a foice desviar-se e o seu bico espetou-se na canela direita.
Agora, com a foice assim espetada, os seus dentes formavam uma espécie de arpão. Deu dores a sair, mas com a paciente ajuda da mãe, inevitavelmente foi extraída, depois de deixar um corte profundo e a sangrar bem.
Sempre paciente, a mãe lavou a ferida com urina que eu vertera e fez, de seguida, das favas que ainda ficaram em jeito de rabisco, descascou uma a fez colar na ferida.
Esta ficou e se pegou.
Resultado:
- O tratamento da ferida ficou feito, não doeu mais e só quando sarou e secou, por completo, a casca da fava caiu.

Daniel Costa



sábado, 1 de dezembro de 2018

OLHEM CAIU A AVIONETA

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OLHEM CAÍU A AVIONETA!... 

A interjeição saiu tal qual como menciona o título, em terras do Vale Medo, lado Oeste da Bufarda, mais propriamente do Casal Foz, Peniche, gritado em uníssono por um grupinho de trabalhadores, que o tio José Miguel trazia de jorna na hora do jantar (meio dia pelo sol hora do almoço nos centros urbanos).
Do pequeno grupo, que o tio tinha reunido orgulhosamente, por serem todos sobrinhos, de que também eu fazia parte. O objectivo era o de proceder à cava da sua vinha e pomar.
Estávamos em pleno mês Janeiro de 1958, o frio e o vento eram intensos, pelo que o jantar procedia-se no abrigo de uma caniceira a servir de protecção à vinha e árvores de fruto.
De repente ouviu-se o avião, que vinha a passar nos ares, o que era vulgar, já que se estava relativamente perto da base aérea da serra de Montejunto. Ao ouviu-se um estrondo, a reacção foi a de ver o que se passara afinal.
O aparelho estava despenhado, desfeito e espalhada a sua estrutura apenas a algumas dezenas de metros, no meio de uma enorme extensão plana, com culturas de trigo, que ainda estava pouco saído da superfície da terra.
Pensou-se no que teria acontecido ao ocupante ou ocupantes, por algumas horas não houve respostas, só a imaginação trabalhava.
Depois a verificação pesarosa da existência de um cadáver, no terreno. Era o da Nazaré, viúva do José Pão, que estava sozinha, na extensa planície a mondar trigo no terreno de um dos filhos. Naturalmente devido à intensidade do frio, não se avistava outra alma, sem dúvida a mulher estava no local errado à hora errada!... Coisas do destino, dizia muita gente que acorreu!...
Chegados perto da noite, soube-se que a avioneta trazia um só tripulante, este conseguira ejectar-se e munido de para quedas, caiu ileso num outro campo de trigo, também perto do mar a cerca de cinco quilómetros no Paimogo.
Os destroços da avioneta foram sendo encontrados por lavradores, a distâncias enormes, sendo recolhidas por estes, procurando empregá-los em proveito próprio.
Daniel Costa

quinta-feira, 29 de novembro de 2018

DIA DE SANTA MARIA


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DIA DE SANTA MARIA

A 2 de Fevereiro, o calendário litúrgico menciona ser o de Santa Maria.
Sempre, o dia me traz recordações, que permanecerão por toda a vida.
A primeira, senão a principal, é ser o dia de anos do pai, no tempo em que este era a figura principal da família, no caso, numerosa família. Quando o pai falava toda a gente para o escutar, sempre assim foi.
Falecido este, bastante novo a ideia da autoridade estava implantada, os filhos nem todos, tinham constituído família.      
Sendo eu o mais velho, devido à existência de alguns bens, que a mãe pensou em dividir por inteiro, anunciou nada fazer sem o meu parecer, visto ser o mais velho, por conseguinte, representava o pai.
Tudo obedeceu e tudo correu como a mãe previra, como se fosse o casal a resolver. Aliás a mãe dizia que me atribuía o estatuto de cabeça de casal, por ser o mais velho. Aqui para nós, terei sido sempre o preferido.
Ao contrário do pai e porque não dizê-lo? De toda a família paterna!
Depois lembro-me, de ainda em garoto, a mãe boa cozinheira, para os anos do chefe ter feito um arroz de bacalhau, que apresentou à ceia (jantar). Pareceu-me ter ficado tão, tão saboroso, a ponto de jamais me ter esquecido. 
Depois outra questão, tendo o pai o nome de José, não terá a ver com o ter nascido no dia de Santa Maria?        
Havia um certo uso, de aplicar nomes aos filhos, dos santos do seu dia de nascimento,  acontece que o pai teve dois tios eclesiásticos.                       
Recordo-me, ser o dia da festa de S. Bartolomeu,  hoje com o acréscimo dos Galegos, conforme sinal de Direcção à saída da Lourinhã, concelho a que pertence.    
S. Bartolomeu, festejava a sua padroeira. À festa profana lá fui duas vezes ao baile, também motivado por um amigo natural da freguesia, que deixei de ver pelo já não me ocorre o nome. Lembro-me de ser irmão de um rapaz a quem tinha falecido a namorada (namorada à maneira do tempo).
Era boa gente, Só podia, para o considerar amigo, só podia ser. Encontrávamo-nos quase todos os Domingos, nos variados bailes, que ia havendo por todas as aldeias, como no Toxofal frequentes, e outros dispersos, normalmente por todo o concelho de Lourinhâ.
A frase de cumprimentos, invariavelmente era seguinte:      
- "Pá… és como o arroz doce, vais a todas!"       
Termino com aquele ditado, que era ao mesmo tempo uma espécie de prevenção:
- “Um dia… é dia de Santa Maria.”

Daniel Costa


quarta-feira, 14 de novembro de 2018

ÁGUA-PE - CHAMPANHE DO POVO

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ÁGUA-PÉ - O CHAMPANHE DO POVO

A água-pé é uma bebida feita de uvas, tal como o vinho, segundo me parece, mais utilizada na região centro de Portugal,
Na Bufarda, concelho de a cidade de Peniche é sede, a noventa quilómetros de Lisboa, considerada região saloia dizia-se com certa verdade ao bebê-la:
- Eis o verdadeiro champanhe do povo!...
Talvez consiga evocar um pouco a bebida, já que ajudei a fabricá-la na adolescência.
No fundo era um vinho mais fraco e sendo mais barato, era o que os patrões utilizavam para dar aos trabalhadores durante o dia, pelo menos no Inverno, depois torna-se menos convidativa.
Em Lisboa, pelo S. Martinho, toda a gente gostava (ou gosta) de comprar a sua água-pé, para acompanhar as castanhas em muitas casas, no tempo vendiam-na avulso.
No entanto, na capital, nunca me seduzia, porque lhe era atribuído o mesmo preço do vinho, mais por vezes, quando no fundo estava a adquirir-se, pura e simplesmente vinho misturado com água.
Também havia quem comprasse uvas, esmagando-as em casa num simples alguidar, em seguida deitava o líquido num recipiente próprio, enchia de água, deixava ferver e pronto!
Proclamava ter feito uma boa água pé!
Até passava dos dez graus!...
Esmagar uvas, fazer vinho, depois e deitar-lhe água nunca dá água-pé, por muito forte que saia.
A verdadeira bebida, que toma a designação, não deve ser feita de vinho mas sim de uva.
Procede-se assim:
- Espreme-se o pé feito do fruto da videira. Por cálculo, sai o mosto para fazer o vinho.
A seguir desmancha-se o pé, estendo-o por todo o lagar. Em seguida deita-se água, pisa-se tudo e deixa-se a macerar cerca de duas horas.
É então que se abre a bica, enquanto vai escorrendo para o tanque, ergue-se toda a massa debaixo da prensa, depois espreme-se até ao fim.
É assim que resulta o tal champanhe.
Que me lembre já o meu avô produzia uma água-pé de estalar e a do meu pai não lhe ficaria atrás, até parecia ter um gasoso, um sabor do outro mundo, com piquinhos e tudo.
Estando com a mão na massa, convém dizer que o bagaço, ficando lavado, no fundo era disso que se tratava, já não dava para fazer aguardente bagaceira.
Também do mosto fervido numa panela, resultava num néctar a que se dava o nome de arrobe, era utilizado na culinária.
Do mosto também se fazia vinho abafado.
Chamado assim, por consistir na simplicidade de não o deixar ferver, abafando-o com bagaço. De imediato fica feita uma bebida melosa e semi-doce.
No Oeste usava-se o método, com fins apenas de renovar a garrafeira da casa.
Diga-se que a venda da água-pé, ao público era e é proibida por lei.
No tempo da outra "senhora", um dia ouvi pedir um café frio.
Questionado o pai sobre o assunto, disse a razão ser simples:
- Quando havia alguém desconhecido por perto, pedia-se assim para evitar complicações, era logo entendido.

Daniel Costa

terça-feira, 13 de novembro de 2018

HORTA DO ARNEIRO


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 HORTA NO ARNEIRO

Apesar do meu desenraizamento, porque Lisboa teve sempre lugar de destaque nos meus anseios e velhos sonhos a Bufarda, aldeia do Oeste, onde nasci e me criei não pode ser esquecida. 
Tanto assim é, que a tenho referido em vários artigos do "JORNAL DA AMADORA", sendo-lhe um dedicado, especialmente.
As vezes que por lá passo são inferiores às recordações guardadas e que, aos poucos espero publicitar, mais como aventuras, já que procuro acompanhar os tempos modernos, com eles delicio-me  
Por volta dos dezoito anos, olhando a courela do Arneiro com bastante água, de restolho no Verão. Ao invés de produzir continuamente, explorando-se a riqueza da água, parece ter entrado no desinteresse do pai.
Assim propus, primeiro ao meu irmão criar ali, de novo a horta a dar que falar.
Este disse: 
- Vê lá em que te metes!..        
- O pai não vai gostar!...           
- Como resposta obteve:         
- Ele não vai saber!         
De seguida falei do projecto à mãe, que sem delongas se entusiasmou.
Resultou um convénio: 
- Produtos da horta:
- O que fosse necessário para, a família.  
- Verba a  realizar:          
- Metade para a casa a outra parte dividida entre mim e o meu irmão.
A horta perante o pai seria clandestina e seria trabalhada nas horas vagas, que tinha de incluir os próprios dias de Domingo.
Naquele Verão, conseguira trabalho sazonal no arranjo da estrada, Lourinhã – Ribamar, o que facilitava, visto o trabalho ser de oito         horas, em lugar do sol a sol   
Sobrava tempo útil para tratar da horta!  
Tudo estava a dar certo, parece que tudo era bem orientado, até que num certo Domingo, numa das tabernas locais, que na altura vendiam de tudo e os homens se encontravam, para confraternizar, beber uns copos e tratar de assuntos, o pai foi abordado por alguém com a conversa seguinte:
- Zéi a tua horta do Arneiro está a ficar um espanto.   
Espantado e admirado ficou o Zéi, mas pelo sim pelo não, depressa foi agarrar a habitual enxada e de imediato deu uma saltada à fazenda.
De facto, estava já a apreciar um belo panorama hortícola, numa propriedade sua sem disso se ter apercebido.          
Entusiasmado com o que viu, entrou de colaborar sem recriminações. A partir daí, era o primeiro colaborador    
No Domingo seguinte pressuroso, foi fazer a habitual rega. 
Eu a ver gostosamente e a descartar-me dessa obrigação.
Só à ceia (ao tempo era assim designado o jantar), o pai ufano disse:
Uma horta daquelas, se não fosse eu, ao Domingo ninguém se lembrava de a regar. Era uma recriminação amigável, mas o gozo que isso dava, tinha de ser refreado.         
A horta pode dizer-se como agora, era biológica          
- O terreno foi enriquecido com estrume, que levávamos do quintal, aos ombros em cestos de verga. O próprio terreno estava um mimo.
Eram partes de vazias e de imediato cobertas com nova produção. Havia de tudo o que se gastava ou transaccionava.  
Até que, fui cumprir o Serviço Militar e pensava ter construído, com a horta um prazer enquanto eficaz meio de rendimento.        
Qual quê?   
- Faltou o animador e apesar de terem ficado dois seguidores, apenas foi gerido o que estava em processo de imediato desenvolvimento.
De resto adeus horta!   
Confesso a minha total desilusão, acentuando mais o meu desejo de recomeçar vida nova a trabalhar em Lisboa.     
A partir daí, deixar rapidamente a Bufarda foi o cumprir do sonho enquanto antídoto.        

Daniel Costa

domingo, 11 de novembro de 2018

O JOGO DA BOLA DE PAU (antigo jogo popular)



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As imagens, são a igreja da Bufarda e uma capoeira conjunta com uma coelheira que já tivera construído no que é hoje propriedade do Gil (era então do meu pai), atrás da igreja.

JOGO DA BOLA DE PAU (antigo jogo popular)


Foi no ano de 1978 que João Paulo I ocupou a Cadeira de Pedro. A sua governação foi efémera, uma das mais curtas da história papal ocasionada pela sua morte, o que alguns comentaristas ainda hoje deixam velado que não terá sido natural.
Um jornal de Lisboa, numa curta biografia do infeliz apóstolo de Roma, fazia referência à sua apetência pelo jogo da bola de pau.
Logo nessa altura, pensei que haveria de tentar desvendar o que para muitos deveria parecer um enigma.
De facto posso assegurar, pelo que deixo descrito; o jogo da bola de pau existia, mesmo, até aos anos cinquenta do século passado. Tudo o que tenho anotado na mente é que, esse jogo terá tido origem numa das muitas criações da Igreja, para sustentar a sua própria organização existencial.
Vi-o ainda a funcionar junto da igreja, cujo orago é a Senhora do Rosário, da aldeia da Bufarda, freguesia de Atouguia da Baleia, concelho de Peniche. Aquele jogo, pertença da comunidade católica, era alugado no fim de cada mês, pelo sistema de leilão, nos meses de Junho a Setembro, época do ano propícia a actividades lúdicas ao ar livre.
Coube-me a mim próprio e a meu irmão, sem o suspeitar darmos por finda, aquela actividade de entretenimento, que se praticava aos Domingos.
Refira-se que aquele Setembro de 1957 conheceu uma agradável temperatura, o preciso para a disputa daqueles torneios, pelo que além do aluguer ter saído a um preço elevado, pouco comum, deu um certo lucro, se considerarmos que se atravessavam tempos de miséria.
Como recordar é viver, lembro que ainda se trabalhava de sol a sol. A aldeia durante os dias da semana encontrava-se deserta e com aquela mais valia acabei por realizar um grande sonho; comprei uma bicicleta em segunda mão.
Custou a módica quantia de 475$00.
Mas, vou explicar o funcionamento do jogo: um local junto ao cemitério encostado à capela, que servia de rua transversal, havia uma barreira do lado norte, por onde os jogadores atiravam as bolas fazendo-as ganhar os efeitos pretendidos a fim de derrubar os respectivos paus, que davam pontos.
O campo tinha o comprimento um pouco superior à igreja e começava por uma grande pedra onde havia esculpidos os lugares para cada um dos palitos e mais um, situado na entrada daquele tabuleiro, a que se dava o nome de vinte, e muito naturalmente, valia mais pontuação.
Junto desse vinte havia um buraco, local onde posta a quantia de dinheiro com que cada jogador entrava. No fim de cada partida disputada em grupo, o detentor do jogo servindo como banqueiro, tirava logo a sua percentagem, sendo o restante entregue ao que ganhava.
As peças eram compostas por vinte e um paus, de cerca de de quarenta centímetros de altura e de duas bolas também de madeira, uma maior e outra menor, para certas escolhas do jogador, daí talvez a origem da denominação, jogo da bola de pau.
De notar que as condições atmosféricas, apesar da situação do campo se encontrar em sítio privilegiado, o muito vento vulgar na zona do Oeste, criava a impossibilidade de se efectuarem jogos vários Domingos seguidos, o que era prejuizo para o alugador.
Como à época ia todos os Dias do Senhor, cumprir um dos mandamentos da lei de Deus à igreja da vizinha aldeia de Riba Fria, via sempre na mesma situação um jogo da bola de pau, mas nunca o vi funcionar.
Um dos grandes jogadores, Abílio Fonseca, anos mais tarde veio a ser meu vizinho em Lisboa, na Avenida Grão Vasco.
E um pouco mais velho, em conversa sobre o assunto informou-me que também havia o jogo na aldeia de S. Bernardino, conhecida praia do Oeste, onde até 1910 laborou um convento de frades. Também a localidade pertence à mesma freguesia.
As três mencionadas, quase em linha completam, situam-se a sul do Distrito de Leiria, no limite do de Lisboa.
Ainda me lembro de alguns jogadores, para além do já citado, até pela sabedoria evidenciada daquele singular entretenimento cujos nomes ou alcunhas, como Zé Lora, Joaquim Trabulento, José Geada, Barbaceca, Gil, os dois guardas fiscais Pissarra e Alves e outros, que aos Domingos davam muita vida própria àquele local, onde funcionava um verdadeiro culto dominical aos tempos de lazer da época.
Para terminar, refira-se que o espaço onde funcionava aquele, diga-se, parque desportivo, bem como o cemitério adjacente, vieram a dar lugar à Casa do Povo local.
Novos e vindouros jamais conhecerão, como eu, um gozo simples daqueles tempos, o passar uma tarde de Domingo a assistir às peripécias de jogos da bola de pau.
Daniel Costa
As imagens, são a igreja da Bufarda e uma capoeira conjunta com uma coelheira que já tivera construído no que é hoje propriedade do Gil (era então do meu pai), atrás da igreja.

sexta-feira, 9 de novembro de 2018

POEMA AREIA BRANCA

 
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AREIA BRANCA

Chamou-se praia da Charrua
Quando a povoação estava nua
Depois Areia Branca
Sazonalmente ali trabalhei
Não devia dizer eu sei
Serventia a pedreiros dei
As primeiras paixonetas
Um pouco a vida ali amei
Olhava a passagem de miúdas
Vinha a sopeirita fardada e bonita
Também a sopeira matrafona
Ares de Dona
Nada de beleza
De observação em observação
Belo tempo de Verão!...
Naquele o Vigia foi erguido
Lá estava ele, entre a terra e mar
Em jeito de vigiar areias
Mulheres bonitas e feias
Diria democrata
Reservado a gente de gravata
Jogava e se divertia
Confraternizava e a noite vivia
As marés e praia vigiavam de dia
Ali amei e deixei amores
Trabalhei e vivi meus senhores!


Daniel Costa

sábado, 3 de novembro de 2018

POEMA NOITES DE LUAR

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NOITES DE LUAR

Chegara o Verão
No redondel da eira
Ao luar havia sempre serão
Eram belas as noites de então
Havia calcadoiros de pão
Os trilhos puxados por bois
Rodavam!...
Vá castanho!...
Bora cabano!...
Com forcados de madeira e ventos
O cereal da palha se separava
Em altos palheiros a desafiar
Intempéries, aguardando ficava
De alguma e outros materiais
A cabana se fabricava
Nas noites de acalmia, ali se dormia
Era, pernoitar ao luar
Em noites felizes de outros mundos
Guardar a eira, mais as inocentes
Anedotas que os vizinhos.
Como o, Zé Pedro, traziam
Eram um rir a fio
Tinha a Gigliola Cinquetti
Vencido o Festival da Eurovisão
O Zé diz: agora casou!
Sabem porque de ser Cinquetti deixou?
Perdeu três
Quarenta e sete adoptou
Depois chegava o milho
Grupos, juntavam-se a escarapelar
De novo, em noites, de luar
Vinham os manguais
Homens aos pares certinhos
Com força até acabar
Pareciam fazer facho
Acima, abaixo!...
Tudo se passava à vista do mar
Em belas noites de luar


Daniel Costa